1.8.06

a revolução das bonecas

Descobri o mundo dos sebos alguns anos antes de ingressar na universidade. Em minha cidade havia apenas um sebinho mequetrefe, bem sujo e tosco, em que o dono julgava o preço de cada livro mais pelo peso do que propriamente pelo seu conteúdo ou raridade (prática que constatei ser comum em sebos de pequenas cidades do interior). Dali saíram os primeiros volumes da minha modesta biblioteca. Como não conhecia coisa alguma sobre o universo dos livros, cada velho exemplar comprado representava um tiro no escuro. Era ler para crer. No final das contas, adquiri muito lixo (do qual aos poucos me livrei), mas igualmente, muita coisa boa. O tempo passou: fui morar longe, me formei, depois mestrado, doutorado, essas coisas todas.... e um dia, em visita aos meus pais, resolvi gastar uma tarde no velho sebo da minha adolescência. Encontrei tudo praticamente do jeito como havia deixado. Boa parte dos livros ficou encalhada por todos esses anos, de modo que me senti reencontrando com velhos dias do passado: as mesmas lombadas expostas nas mesmas prateleiras, a mesma poeira, o mesmo cheiro de mofo, os mesmos preços... o tédio de livro em sebo do interior! Comprei apenas um, por sinal um velho conhecido do tempo em que eu freqüentava diariamente o tal sebo. Naquela época, chegava a tirá-lo constantemente da estante para admirar sua capa. Achava-a interessante, bem chamativa (depois fui descobrir que havia sido feita pelo Ziraldo, aquele que nunca brochou). Porém o título sempre me desestimulava a levá-lo para casa: “A Revolução das Bonecas”. Pensava comigo: “mas que palhaçada é essa?”. E a verdade é que sequer cheguei a folheá-lo naquela época para tirar a dúvida. O nome do autor também não ajudava em nada: José Carlos Oliveira. Puta nomezinho comum! Tão comum que ficava até difícil de lembrar. Pois bem. Dessa vez comprei o tal livro. E me surpreendi!! É hoje um dos meus livros preferidos. Não é nenhuma obra prima da literatura universal que torne seu autor digno de um Nobel (isso não aconteceria, em primeiro lugar porque ele já foi pro beleléu). Mas é bem do meu agrado. Trata-se de uma coletânea de crônicas publicadas no Jornal do Brasil, entre 1963 e 1966. Seu estilo mistura criatividade, lirismo e talento com um humor seco e sarcástico. É facil notar também a influência direta das idéias de Albert Camus (principalmente o Camus de “O Mito de Sísifo”) nas obsessões de J.C.O. pelo tema do absurdo. Se você curte um sebinho e der de cara com um exemplar desses, recomendo. A edição que comprei foi impressa em novembro de 1967, talvez a única que tenha sido lançada, e meu exemplar é o de número 0825.